Fé e Obras: Por que “Somente a Fé” Não Basta Segundo a Verdade Católica (Minha Conversão: Parte VII)

Patrícia Castro

7/8/20256 min read

Durante muitos anos da minha vida, especialmente durante meus 28 anos em que fazia parte de denominação protestante, fui ensinada a crer que a salvação se dá exclusivamente pela fé. Essa doutrina, conhecida como Sola Fide (somente a fé), afirma que basta crer para ser salvo — as obras então seriam irrelevantes ao entendimento correto da graça de Deus.

Essa crença, firmada por Martinho Lutero no século XVI, foi uma das colunas centrais da Reforma Protestante. Segundo Lutero, as obras não teriam papel algum na justificação do homem diante de Deus, para que “nenhum se glorie”.

Recentemente, no debate entre o Padre José Eduardo e o pastor Tassos Lycurgo (https://www.youtube.com/live/mQRx1epMpMs?si=rvoIsk3SsbpfSucB), uma das questões centrais foi a doutrina protestante da Sola Fide — a ideia de que a salvação ocorre “somente pela fé”, sem necessidade de obras. O pastor defendeu essa posição com firmeza. No entanto, tanto as Escrituras quanto a Tradição e o Magistério da Igreja revelam que essa visão é incompleta e se afasta da verdade plena revelada por Cristo e vivida pelos apóstolos.

Entendendo a Doutrina Protestante da Sola Fide

Para o protestantismo, a Sola Fide é a única condição para a salvação: a fé pessoal em Jesus Cristo, sem obras, sem méritos, sem cooperação humana. A Confissão de Augsburgo (1530) ensina que "Os homens são justificados gratuitamente, pela fé, por causa de Cristo." Essa doutrina é amplamente aceita em igrejas luteranas, calvinistas, batistas, pentecostais e grande parte do evangelicalismo moderno.

Não é que os protestantes não considerem as boas obras importantes, mas, para eles, elas não têm nenhum papel na justificação; seriam apenas sinais externos de uma fé interior já salvadora. O raciocínio se baseia, por exemplo, no ladrão na cruz (Lc 23:42-43): ele creu e foi salvo, sem ter feito boas obras visíveis.

O princípio protestante é: "Não faço boas obras para ser salvo; faço boas obras porque já fui salvo." Isso implica que, se alguém crer sinceramente em Jesus, está salvo, mesmo sem mudar de vida. A Confissão de Westminster (1646) afirma: "A justificação é somente pela fé, sem qualquer adição de obras".

Observe o perigo concreto dessa crença: uma pessoa que se considera “'salva” por ter “aceitado Jesus”, mas que continua a viver deliberadamente no pecado — seja em adultério, desonestidade ou qualquer outra transgressão grave — acredita que essa mera “fé” inicial basta. Para ela, a vida que leva é irrelevante, pois a “salvação não depende de obras”. Essa visão reduz a justificação a um mero ato declarativo de Deus, desvinculado de qualquer transformação real do coração e da conduta humana, o que contradiz o próprio chamado de Cristo à santidade e à conversão contínua.

Martinho Lutero chegou a dizer: "Se pecares, peca fortemente, mas crê mais fortemente." (Carta a Melanchthon, 1521).

O Problema da Sola Fide: Incompletude e Perigos Espirituais

Vejamos, meu caro leitor, o que diz as Escrituras e a Tradição da Igreja sobre essa maliciosa doutrina do Sola Fide:

1 - Contradição Bíblica:

A Sola Fide contradiz a própria Palavra de Deus. Embora Paulo exalte a fé, São Tiago é inequívoco ao afirmar: "De que adianta... alguém dizer que tem fé, se não tem obras? Acaso essa fé pode salvá-lo? A fé sem obras é morta." (Tg 2:14, 26). Ele inclusive aponta que "Até os demônios creem – e tremem" (Tg 2:19), evidenciando que uma fé meramente intelectual não basta. Além disso, o próprio Jesus ensinou que seremos julgados pelas nossas ações concretas de caridade (Mt 25:31-46), e Paulo nos lembra que fomos "salvos pela graça, mediante a fé... para as boas obras que Deus preparou" (Ef 2:8-10). A fé autêntica se manifesta em obras.

2 - Ruptura com a Tradição Apostólica:

A Sola Fide é uma inovação histórica que rompe com o ensinamento consistente da Igreja primitiva. Padres apostólicos como Santo Inácio, São Justino Mártir e Santo Irineu unanimemente ensinavam que a salvação exige uma fé viva, arrependimento e a prática da caridade. A ideia de uma fé isolada das obras era completamente estranha à Tradição que nos foi legada.

3 - Desvirtuamento da Fé e Perigos Espirituais:

Reduzir a fé a um mero assentimento interno "desencarna" o Evangelho, gerando graves perigos. Essa visão pode fomentar a licenciosidade e a presunção, levando a uma "fé" que não transforma a vida. Uma pessoa que se diz crente mas não perdoa, não se confessa, e não luta contra o pecado, justificando-se com "Jesus já me salvou", vive uma fé estéril, sem frutos, que contradiz radicalmente o Evangelho de Cristo e o chamado à santidade."

A Igreja Católica Crê na Fé, Mas Não na Fé Isolada

A Igreja nunca negou a importância da fé. Pelo contrário, ensina que a salvação começa pela fé e é sustentada pela graça de Deus. No entanto, a fé, para ser eficaz e salvífica, deve estar unida às boas obras — frutos visíveis da graça atuando no coração transformado pelo amor de Deus. A salvação não é um evento pontual, mas um processo contínuo no qual a pessoa corresponde à graça divina com liberdade, perseverança, fé viva e obras concretas de caridade. Fé é a resposta do homem ao Deus que se revela.

Por Que a Fé Católica é a Fé Bíblica?

Porque ela une o que Deus uniu:

· Fé e obras: Como São Tiago e São Paulo demonstram.

· Graça e resposta: A graça nos capacita a responder com amor.

· Amor e obediência: A verdadeira fé se manifesta na obediência amorosa a Deus.

A fé católica não separa crer de viver. Ela entende que a salvação é uma aliança, não uma transação. Uma pessoa que trai o seu cônjuge, por exemplo, precisa se arrepender, confessar, mudar de vida, reparar os danos e buscar a santidade. Sua salvação está em andar na fé com obras vivas, perseverando na graça. Alguém que vive de enganar as pessoas, também precisa fazer o mesmo. Da mesma forma, um jovem católico que ama Jesus, frequenta os sacramentos, ajuda os pobres, foge do pecado e luta para ser santo, vive uma fé viva, provada no amor — isso é o cristianismo autêntico.

A Justificação como Processo de Transformação Real

Para a Igreja, a justificação é um processo de transformação real, que exige cooperação humana pela graça: crer, arrepender-se, amar, obedecer, sacrificar-se. Não é apenas uma declaração forense, mas uma renovação interior.

A Graça de Deus é o Fundamento de Tudo

A Igreja Católica crê firmemente que a salvação é graça — um dom gratuito, imerecido e abundante. Mas essa graça não nos anula, nem nos torna passivos. Pelo contrário, ela nos capacita a cooperar com Deus. Assim como um campo precisa da chuva (graça) para produzir, também precisa ser arado e cuidado (resposta humana). Sem a graça, nada podemos. Mas com a graça, somos chamados a corresponder com amor, perseverança e obediência.

Conclusão: Uma Compreensão Completa e Bíblica da Salvação

A doutrina protestante da Sola Fide gerou um desequilíbrio teológico ao separar fé de obras, fé de perseverança, fé de caridade, ela corta a fé da sua vitalidade. Minha própria experiência me mostrou a incompletude dessa visão. A Igreja Católica, com base nas Escrituras, na Tradição e no Magistério, oferece uma visão plena e bíblica da salvação:

· Sim, somos salvos pela fé.

· Sim, é tudo graça.

· Mas sim: devemos corresponder com obras de amor.

Fé e obras não se opõem. São como a alma e o corpo da vida cristã. Uma fé que não se traduz em ação é uma fé morta. E obras sem fé não têm raiz nem valor salvífico. Por isso, ao abraçar a fé católica, encontrei uma compreensão mais completa e viva do Evangelho.

Por isso, ao proclamarmos a verdade do Evangelho, dizemos com a Igreja de todos os séculos, como está no Catecismo (§1815) e no Concílio de Trento (Cânon 9, Sessão VI):

A fé sem caridade não dá frutos. A fé sem obras é morta.” “A fé, se não estiver acompanhada da caridade, não nos une perfeitamente a Cristo.” Ou seja: "A fé sem obras é morta. Mas a fé que atua pelo amor conduz à vida eterna."