Salve, Santa Rainha: Maria está na Bíblia – o protestante é que não enxerga (Minha conversão: Parte VIII)
Patrícia Castro
7/16/20256 min read
A conversão à fé cristã, sob a perspectiva católica, difere profundamente da visão protestante. Para muitos evangélicos, basta crer em Jesus e confessá-lo com a boca para ser considerado cristão. Já para a fé católica, a conversão é um processo contínuo, uma jornada que se desenvolve ao longo da vida. À medida que a alma se abre a Deus com docilidade e sede de verdade, ela vai conhecendo, aderindo e conformando-se cada vez mais a Cristo — até alcançar a estatura do "varão perfeito", que é a santidade.
Na minha caminhada de conversão, precisei confrontar ponto por ponto aquilo que diferenciava a fé católica da tradição protestante que conhecia. Iniciei essa busca de forma investigativa. Primeiro, compreendi o ensinamento da Igreja sobre a contracepção e percebi sua coerência com a dignidade humana e com o plano divino para a vida. Depois, percebi que o princípio do Sola Scriptura não se sustentava nem biblicamente, nem historicamente. Entendi também que a salvação não é fruto de uma fé isolada, mas de uma fé viva, que se expressa em obras concretas. Foi então que enfrentei um dos maiores desafios: descobrir quem, de fato, é Maria.
Maria esquecida: a grande ausência no protestantismo
Maria, essa mulher de virtudes extraordinárias, quase nunca é mencionada nos cultos protestantes. Enquanto se exaltam figuras como Sara, Ester, Raquel e Rute, Maria permanece à margem, mesmo sendo a mais elevada entre todas as mulheres. Lembro-me de um pastor que dizia que chamá-la de “Mãe de Deus” era blasfêmia — como se isso implicasse que Deus tivesse origem ou dependência de uma criatura. Mas ele jamais parou para refletir que Maria é, sim, Mãe do Filho de Deus, que se fez carne no tempo. O Verbo eterno assumiu nossa humanidade e nasceu de uma mulher — e isso não diminui Sua divindade, mas a revela em sua forma mais próxima e misericordiosa.
Afinal, se Jesus permanecesse tão e somente com sua natureza divina, como poderia ser ponte entre Deus e os homens?
Com o tempo, percebi que o conceito de Deus, no protestantismo, é reducionista. A ideia de que todos têm acesso direto a Deus porque “o véu foi rasgado” é verdadeira, mas precisa de contexto. No Antigo Testamento nos é revelado claramente a santidade inacessível de Deus: quem tocava na Arca da Aliança morria; apenas o sumo sacerdote podia entrar no Santo dos Santos — e somente uma vez por ano. Quando Deus falou ao povo no Sinai, todos tremeram e pediram que Ele falasse apenas com Moisés. Deus não mudou, continuou sendo Santo, e portanto, inacessível fisicamente ao homem. Porém, por amor, esse Deus tão majestoso escolheu habitar o ventre de uma mulher. Mas, essa mulher não poderia ser uma pecadora qualquer pois, se assim o fosse, como poderia conter em seu seio Aquele diante de quem até os céus se curvam?
O Dogma e a Bíblia: Maria, a Imaculada
Compreender a natureza divina de Cristo unida à humanidade de Maria levou-me à aceitação do dogma da Imaculada Conceição: Maria foi preservada do pecado original em vista dos méritos de Cristo, antecipando, de modo singular, a redenção. Isso está claramente aludido nas palavras do anjo: “Ave, cheia de graça” (Lc 1:28). Para um protestante, pode soar estranho dizer “Tudo por Jesus, nada sem Maria”, mas o que essa frase expressa é uma realidade profundamente cristocêntrica: Jesus é o único Salvador, mas Maria é o modelo perfeito de fé e obediência. Ao honrá-la, seguimos o exemplo da criatura que mais amou e mais se uniu ao Senhor.
Na visitação de Maria, grávida à sua prima Isabel, ela a reconhece como mãe do salvador.
A passagem detalha:
A chegada e a saudação: "Ela entrou na casa de Zacarias e saudou Isabel" (Lucas 1:40).
A reação de Isabel: "Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, o bebê pulou em seu ventre, e Isabel ficou cheia do Espírito Santo" (Lucas 1:41).
As palavras de Isabel: "E exclamou em alta voz: 'Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre!'" (Lucas 1:42).
A resposta de Isabel sobre a maternidade de Maria: "E de onde me vem que a mãe do meu Senhor me visite?" (Lucas 1:43).
O cântico de Maria: "Maria disse: 'A minha alma glorifica ao Senhor, e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador, pois ele viu a humildade de sua serva. De agora em diante, todas as gerações me chamarão bem-aventurada, pois o Poderoso fez grandes coisas em meu favor; santo é o seu nome.'" (Lucas 1:46-49).
Scott Hahn e o reencontro com Maria nas Escrituras
Foi lendo Salve, Santa Rainha, de Scott Hahn — renomado teólogo católico convertido do protestantismo — que minha compreensão sobre Maria mudou radicalmente. Hahn mostra, com maestria e base bíblica, que Maria não é um enfeite devocional da fé cristã, mas uma figura central na história da salvação, prefigurada no Antigo Testamento e plenamente revelada no Novo.
Tipologia bíblica: Maria como Nova Eva e Arca da Aliança
Hahn aplica a tipologia bíblica — método que reconhece no Antigo Testamento figuras que prefiguram realidades futuras. Assim como Jesus é o Novo Adão, Maria é a Nova Eva: onde Eva desobedeceu, Maria obedeceu; onde Eva cooperou com a queda, Maria colaborou com a redenção.
Maria também é identificada como a Arca da Nova Aliança. A Arca antiga continha as tábuas da Lei, o maná e o cajado de Arão. Maria, por sua vez, carregou em si o Verbo encarnado, o verdadeiro Pão do Céu e o Eterno Sumo Sacerdote. O evangelho de Lucas, sobretudo no episódio da Visitação, faz paralelos diretos com a Arca descrita em 2 Samuel.
A simbologia mariana se estende até o Apocalipse: a mulher vestida de sol (Ap 12) é interpretada por Hahn como símbolo da Igreja, de Israel, e, ao mesmo tempo, como figura da Mãe do Messias — coroada, gloriosa e combatente.
Foi ao chegar a esse ponto que os véus caíram dos meus olhos. Maria sempre esteve nas Escrituras — eu é que não a via, porque a lia com os filtros da ideologia e da suspeita. Foi nesse momento que entendi a importância do Magistério e da Tradição: sem eles, a leitura bíblica se fragmenta, torna-se vulnerável à interpretação subjetiva e, frequentemente, contraditória.
As doutrinas marianas à luz da Escritura
Scott Hahn demonstra que as principais doutrinas marianas são coerentes com a revelação bíblica e a fé apostólica:
· Imaculada Conceição: Maria foi preservada do pecado original por graça antecipada, como indicado em Lucas 1:28 ("cheia de graça").
· Virgindade perpétua: Maria permaneceu virgem antes, durante e depois do nascimento de Jesus, em sinal de consagração total a Deus.
· Assunção de Maria: Embora não descrita explicitamente na Bíblia, é consequência lógica de sua Imaculada Conceição e da vitória de Cristo sobre a morte.
· Coroação como Rainha do Céu: Inspirada na tradição dos reis davídicos, onde a mãe do rei (a gebirá) tinha papel de honra e intercessão. Maria, como Mãe do Rei dos Reis, ocupa esse lugar.
Maria, Rainha e Mãe espiritual
Nos reinos de Israel, a gebirá era a mãe do rei, e seu papel era altamente respeitado. Essa imagem se aplica a Maria: como Mãe do Messias, ela é a Rainha-Mãe do Reino de Deus. Essa realidade se torna ainda mais clara nas palavras de Jesus na cruz: “Eis tua mãe” (Jo 19:27), dirigidas ao discípulo amado — um gesto que confere a maternidade espiritual de Maria a todos os cristãos.
Respondendo às objeções protestantes
Como ex-protestante, Hahn compreende bem os temores em relação à devoção mariana. Ele mostra que venerar Maria não diminui a centralidade de Cristo — pelo contrário, a realça. Maria é criatura, não deusa; tudo nela remete ao Filho. Seu apelo permanece o mesmo de Caná: “Fazei tudo o que Ele vos disser” (Jo 2:5).
Além disso, os dogmas marianos não são invenções tardias, mas desdobramentos da fé apostólica, reafirmados pelos primeiros cristãos e enraizados nas Escrituras.
Maria como modelo espiritual
Mais que uma figura teológica, Maria é modelo de vida cristã. Ela nos ensina a fé obediente, a humildade silenciosa, a entrega total à vontade de Deus. Em tempos de confusão espiritual, sua presença materna cura a orfandade interior de muitos cristãos. Reconhecer Maria como mãe é reencontrar nossa identidade de filhos e filhas de Deus.
Salve, Santa Rainha não é apenas um livro de mariologia — é um testemunho de conversão, um convite ao reencontro com a Mãe do Senhor. Por meio de uma leitura bíblica sólida e espiritualidade enraizada na Tradição, Scott Hahn mostra que amar Maria é caminho seguro para amar ainda mais profundamente a Cristo.
Conclusão: A Mãe nos leva ao Filho
Minha jornada de fé continua, mas agora com a certeza de que tenho uma Mãe que caminha comigo. Não como obstáculo, mas como ponte segura rumo ao coração de Deus — pois ninguém teve mais acesso a Jesus do que ela.
Depois de tantos sofismas desfeitos, não me restou outra escolha senão me dobrar à verdade. A partir desse ponto, meu maior desejo foi entrar no grandioso castelo que é a Igreja de Cristo, ciente de que, do lado de fora, jamais vislumbraria o tesouro que ela guarda há mais de 2000 anos.

